O uso irresponsável do WhatsApp em Moncloa

O vazamento de conversas privadas de WhatsApp entre o primeiro-ministro Pedro Sánchez e o ex-ministro dos Transportes José Luis Ábalos trouxe à tona mais uma vez — assim como em maio de 2022, quando a Moncloa denunciou que vários membros do Executivo haviam sido espionados usando o Pegasus — a segurança do ambiente de comunicação entre os mais altos escalões do poder. O sistema que protege os celulares não está mais sendo questionado, pois é óbvio que os chats não foram obtidos por um vírus malicioso como o que infectou os telefones dos líderes pró-independência, mas sim por pesos pesados do governo se comunicando por um sistema de mensagens como o WhatsApp, que tem sido questionado por inúmeros serviços de segurança. O uso do WhatsApp pelos ministros é ainda mais surpreendente considerando que o governo tem seu próprio aplicativo de comunicação interna desenvolvido pela Indra: o COMSec.
O desenvolvimento do aplicativo COMSec é nacional; uma condição essencial para a inteligênciaO Palácio da Moncloa conta com um sistema próprio de comunicações seguras entre a Presidência e os membros do Governo, bem como com outras instituições estatais de alto escalão. Ela só permite a comunicação entre instituições que a possuem. E ele só é usado em situações de extrema emergência, como o apagão que atingiu a Espanha em 28 de abril. "A legislatura provavelmente terminará sem que o Ministro da Cultura o utilize", diz um ministro que já precisou recorrer a ele em seu gabinete em diversas ocasiões. Este membro do Governo e a maioria dos seus colegas conservam o seu telemóvel pessoal, que utilizavam para comunicar com os seus círculos antes de entrarem para o Conselho de Ministros, e outro "seguro" fornecido pela Moncloa quando foram nomeados para as suas respectivas pastas. Esses terminais estão sujeitos a verificações de rotina pelo Centro Criptológico Nacional (CCN).
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O COMSec é instalado nesses dispositivos móveis, oferecendo serviços de comunicação criptografados de ponta a ponta para voz, vídeo, mensagens e transferências de arquivos entre usuários do sistema. Com uma aparência muito parecida com a do WhatsApp — permite até criar grupos — ele usa senhas aleatórias para cada chamada ou mensagem. Mas acima de tudo, a chave — e uma condição indispensável para os serviços de inteligência — é que o desenvolvimento da tecnologia seja nacional. Por isso, especialistas em segurança cibernética como Josep Albors, chefe de pesquisa e conscientização da ESET Espanha, estão surpresos com as mensagens entre Sánchez e o outrora todo-poderoso do PSOE: não pelo conteúdo, mas pelo uso do WhatsApp, que pertence ao Meta.

Imagem do COMSec
LV"Está nas mãos dos Estados Unidos. Por razões geopolíticas, não é nada aconselhável", afirmou Albors em conversa telefônica. Ele explicou que as leis dos EUA exigem que provedores de serviços, como o WhatsApp, forneçam informações armazenadas, citando interesse nacional, e que eles podem burlar as regras. Isso não seria lógico entre países aliados, mas poderia ser tecnicamente possível. Albors dá o exemplo de quando um usuário troca de aparelho celular e o WhatsApp permite que ele recupere todas as suas conversas anteriores, que estavam armazenadas na nuvem.
O problema com o COMSec é que a licença para instalá-lo está disponível apenas para alguns poucos selecionados, então, se membros do governo querem conversar com outro usuário, eles tendem a recorrer ao WhatsApp, como têm feito esta semana, apesar das conversas serem tornadas públicas. O Conselho de Ministros não acredita que os vazamentos marcarão uma virada no uso de seus aplicativos de mensagens. Especialistas em segurança cibernética apontam para um sistema intermediário como o Signal, com maior proteção de metadados e sem compartilhamento de informações com terceiros. Este aplicativo não permite que você faça capturas de tela das conversas, mas permite que você impeça o teclado do seu telefone de gravar o que você digita ou permite que você redirecione uma chamada para ocultar seu endereço IP.
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