Governo homologa parecer da PGR que contraria Moedas

A 8 de julho deste ano, Carlos Moedas reuniu-se com a nova ministra da Administração Interna e assumiu que Maria Lúcia Amaral concordava com ele a propósito da alteração das funções da Polícia Municipal de Lisboa. “A senhora ministra entende exatamente a necessidade de a Polícia Municipal poder fazer detenções sem ser órgão de polícia criminal”, disse o presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Apesar disso, sabe-se agora que o Governo homologou um parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República que contraria a ordem do autarca do PSD, revela o Diário de Notícias.
Consta no parecer 8/2025 que as polícias municipais não são forças de segurança nem órgãos de polícia criminal e que, sendo os agentes desta polícia apenas administrativos, está-lhes vedada a investigação criminal e as detenções — excetuando a “detenção de suspeitos de crime punível com pena de prisão, em caso de flagrante delito”, que devem ser imediatamente entregues a autoridade judiciária ou a entidade policial.
Carlos Moedas dá ordem à Polícia Municipal para passar a fazer detenções em Lisboa
Para a PGR, é falso que “sendo as Polícias Municipais de Lisboa e do Porto constituídas [exclusivamente] por pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública (…) manteriam assim o originário estatuto e competências de ‘autoridades e órgãos de polícia criminal’, por ocorrer um ‘cúmulo de competências’, de polícia administrativa e de órgão de polícia criminal”, cita o Diário de Notícias.
Entendem, com “absoluta clareza”, que o “efetivo das polícias municipais” de Lisboa e Porto “não integra — nem pode integrar — entidades com as competências próprias de autoridades de polícia criminal”.
A PGR visa as tomadas de posição de Carlos Moedas e reitera a lei que define o funcionamento da Polícia Municipal, enfatizando que a Polícia Municipal já pode deter, mas apenas em casos específicos. “Na verdade, ‘os agentes das polícias municipais [somente] podem deter suspeitos no caso de crime público ou semi-público punível com pena de prisão, em flagrante delito, cabendo-lhes proceder à elaboração do respetivo auto de notícia e detenção e à entrega do detido, de imediato, à autoridade judiciária, ou ao órgão de polícia criminal'”, continuam, citados pelo DN.
“Os ‘polícias municipais’ nesses casos — embora somente nesses casos, tipificados na lei — têm competência para ‘deter suspeitos’; mais sendo certo que não ficam a aguardar pela chegada do órgão de polícia criminal, bem pelo contrário, têm de, ativamente, proceder à ‘imediata’ entrega do detido à autoridade judiciária, ou ao órgão de polícia criminal competentes”, manifestam, contrariando a visão de Moedas.
Apesar de o parecer da PGR já ter sido homologado pelo MAI, o documento ainda não foi publicado em Diário da República, como é obrigatório, noticia o DN.
Questionada pelo mesmo jornal, a Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) diz que instaurou um processo administrativo para averiguar a atuação de polícias municipais em reportagens divulgadas pelo canal Now, nas quais os agentes surgem a deter vendedores ambulantes e a entrar como “turistas” em estabelecimentos que funcionam como restaurantes clandestinos. Por sua vez, a PGR não esclareceu se o Ministério Público recebeu queixas sobre estas atuações.
Antes do parecer agora divulgado, a posição de Carlos Moedas já tinha merecido críticas não só da oposição, mas também dúvidas do Presidente da Câmara Municipal do Porto ou da anterior ministra da Administração Interna.
Ouvida no Parlamento, Margarida Blasco assumiu “algumas dúvidas jurídicas” sobre a hipótese levantada por Carlos Moedas. “As polícias municipais, que têm na sua origem policias provenientes da PSP, são polícias administrativas”, disse, antes de remeter qualquer conclusão para o parecer da PGR.
Já Rui Moreira qualificou esta proposta como “um disparate e um perigo” e disse que esta alteração das competências apresentava o risco de levar ao “modelo americano dos xerifes”. “As polícias municipais de Lisboa e do Porto são constituídas por agentes da PSP. Mas a nossa função não é investigação criminal. Não defendemos esse modelo, e creio que se correm sérios riscos com isso”, disse Rui Moreira ao DN em setembro de 2024.
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