Será exagerado falar em invasão migratória?

Escrevia há dias João Marques de Almeida, a propósito do Presidente da República Portuguesa, que relativamente à “questão da imigração, os números não contam, o que conta são as “narrativas” nos media”. Numa simples frase, resumiu toda a política seguida pela maioria das elites europeias (e também americanas) nas últimas cinco décadas: o que importa não é o ser, mas o parecer. O que conta não é a razão, mas sim o pathos de que falei no texto anterior — a primeira parte da minha reflexão sobre imigração — ou seja, os sentimentos. É a política dos “bons sentimentos”, das “sondagens de popularidade”. Mas de facto: os números contam. Recentemente, o Presidente norte-americano, Donald Trump, afirmou que a Europa precisava de acordar e resolver a “horrível (sic) invasão de imigrantes que está a destruir a Europa”. Quando Trump fala em “invasão migratória”, não se refere, por exemplo, à imigração de europeus para os Estados Unidos ou de americanos para a Europa. Refere-se, sim, à imigração extra-europeia — ou, mais precisamente, extra-ocidental — muitas vezes proveniente do chamado Terceiro Mundo. Ou seja, à entrada de populações oriundas de fora da Civilização Ocidental, frequentemente muçulmanas, que emigram tanto para a Europa como para os Estados Unidos.
Mas será que o termo “invasão” é apropriado? Serão os números assim tão elevados que justifiquem o uso de uma palavra tão forte? Se há um mantra repetido até à exaustão por parte de algumas elites europeias — aquelas que trabalham em Bruxelas, vestem fatos Armani e auferem salários de 30.000€ mensais — é o de que a Europa sempre foi uma terra de imigração, naturalmente aberta a povos de todo o mundo. Segundo essa narrativa, o continente europeu teria sido, desde sempre, um espaço de encontros, miscigenação e sociedades multiculturais. “O Islão é uma religião europeia” segundo alguns. “Sem os árabes, os europeus ainda estariam a viver na Época Mediéval”, dizem outros (que têm uma grande imaginação, ou problemas mentais, ou ambos). Assim, qualquer pessoa que manifeste preocupação com os actuais níveis elevados de imigração é, quase automaticamente, rotulada de xenófoba, de racista, de islamófobo. Mas será mesmo assim? Não haverá uma parte de verdade quando falamos em números absurdos de entradas de imigrantes?
Responder a esta questão sem estatísticas é coisa impossível. E um dos erros que muitos à direita cometem é não aprofundar o tema com estatísticas oficiais. Quanto à esquerda, está fora de questão mencionar números — as estatísticas têm de ser silenciadas e, pelos vistos, a realidade é, para alguns, racista… Contudo, mais do que nunca, é necessário termos uma visão geral de um fenómeno que — e os resultados eleitorais mostram-no — tem preocupado os ocidentais, tanto na Europa como nos Estados Unidos. Se, nalguns países — e Portugal é um bom exemplo disso — as estatísticas são muito opacas, noutros não é o caso. Além disso, muitos dados oficiais provenientes de institutos estatais misturam imigração intra-UE, intra-europeia, com imigração vinda dos tais países do chamado Terceiro Mundo, o que torna a questão ainda mais difícil de analisar. Isto abre espaço a todo o tipo de delírios: à direita, por exemplo, a ideia de que já haverá 30 ou 40% de muçulmanos na União Europeia — número que li muitas vezes em comentários e que é completamente falso; ou à esquerda, a repetição constante de que os estrangeiros extra-europeus representam apenas 1 ou 2% da população da UE — estatística que ouvimos há 40 anos, como se o número de pessoas vindas de fora da Europa nunca tivesse crescido, como se houvesse tantos nascimentos como mortes nessas populações e tantas entradas como saídas. Nem uma postura nem a outra são correctas. Por isso, proponho que vejamos os números — os que são oficiais, pelo menos.
Comecemos pela União Europeia. Em 2024, havia 29 milhões de cidadãos não europeus na UE, 6.4% dos 449.3 milhões de cidadãos da EU (fonte). Em 2023, os países da UE concederam 5,1 milhões de autorizações de residência a cidadãos de países terceiros, ou seja, que não são membros da UE (fonte). No mesmo ano, registavam-se 25,1 milhões de autorizações de residência válidas na União (incluindo renovações de anos anteriores – fonte). Em 2024, esse número ultrapassa já os 28 milhões. A maioria das pessoas que beneficiaram dessas autorizações provinham de Marrocos, Turquia e Ucrânia – este último, um país europeu que não integra a UE (fonte). Mas encontramos também outras nacionalidades com presença significativa, como argelinos, tunisinos, congoleses, nigerianos, paquistaneses e afegãos (fonte; fonte).
Desde 2015, ano da crise dos refugiados da Síria, têm entrado, em média, entre 2,6 e 4 milhões de pessoas na União Europeia, vindas de fora do espaço comunitário: 2,6 milhões em 2015; 3 milhões em 2019; 3,7 milhões em 2023; e cerca de 4 milhões em 2024 (fonte). Quanto à imigração ilegal, esta tem vindo a crescer de forma constante ao longo da última década, até registar um ligeiro recuo em 2024: nesse ano, entraram ilegalmente cerca de 239 mil pessoas na UE, segundo o Frontex, enquanto no ano anterior o número tinha sido bastante superior, atingindo 385.000 (fonte). A militarização das fronteiras no caso da Polónia e da Finlândia tornou o acesso mais difícil para migrantes económicos ilegais, e pode explicar esta diminuição, bem como políticas cada vez mais duras como no caso da Grécia.
Segundo o Eurostat (dados de 1 de Janeiro de 2024), 44,7 milhões de pessoas a viver na UE tinham nascido fora do território comunitário (fonte). Este número engloba diferentes perfis: pessoas que mantiveram a cidadania do país de origem, sem adquirirem a de um país da UE (por exemplo, sírios, marroquinos, turcos, congoleses); pessoas nascidas fora da UE mas que adquiriram posteriormente a nacionalidade de um Estado-membro (por exemplo, um cidadão indiano que se torna português); e ainda pessoas nascidas em países europeus que só mais tarde passaram a integrar a União Europeia, como é o caso de um romeno nascido em 1990. Este total de 44,7 milhões representam um aumento de 2,3 milhões face ao ano de 2023.
Contudo, estes dados não nos dizem, por exemplo, quantos extra-europeus — pessoas cujas origens não são europeias — imigram para a Europa (no seu sentido mais amplo), nem quantas pessoas de origem extra-europeia (de segunda, terceira, quarta geração) vivem na Europa. Só assim poderemos ter uma visão mais geral da verdadeira dimensão da imigração extra-europeia para o continente. Creio que um pequeno “tour” pelos principais países europeus nos permitirá compreender melhor a amplitude deste fenómeno.
Comecemos pela França, um dos países que mais tem recebido imigrantes extra-europeus. O INSEE (o Instituto Nacional de Estatística e Estudos Económicos de França) estimava que, em 2023, havia 7.3 milhões de imigrantes (10.7% da população), dos quais 2.5 milhões adquiriram a nacionalidade francesa, e 5.6 milhões de estrangeiros (fonte). Mas os números reais poderão ser bem maiores. Há quatro anos, André Posokhow, especialista no custo da imigração em França, publicou um livro que causou alguma polémica: Immigration, l’Épreuve des Chiffres, no qual este estimava que havia uns 16 milhões de cidadãos estrangeiros ou de origem estrangeira (2° gerações incluídas). Deste total, 5,5 milhões seriam de origem europeia, e 11,3 milhões seriam extra-europeus. Quer isto dizer que 25% da população em França é estrangeira ou tem origens directas estrangeiras, e que 16,6% da população francesa não é nativa da Europa. Isto sem contabilizar as terceiras, quartas e quintas gerações.
Para terem uma pequena ideia, em 1950 os extra-europeus representavam menos de 1% da população francesa. Em 1975, a maior minoria estrangeira em França era europeia: tratava-se dos portugueses, com 759 mil pessoas, correspondendo a 22% da população estrangeira, muito acima dos extra-europeus na época (fonte). De facto, se a França se tornou uma terra de imigração desde o século XIX, foram sobretudo polacos, espanhóis e italianos que inicialmente chegaram. Só a partir dos anos 80 do século XX é que houve uma clara mudança na imigração.
E nos outros países europeus? A situação é semelhante, com um aumento no número de imigrantes sobretudo a partir dos anos 80. Os Países Baixos tinham 9,2% da população de origem estrangeira em 1972; 46 anos depois, em 2018, a população estrangeira ou de origem estrangeira representava 23,1% do total (fonte). Destes, pelo menos dois terços serão extra-europeus, segundo a especialista em demografia Michèle Tribalat (fonte). Isto quer dizer que cerca de 15% da população holandesa é extra-europeia. A este ritmo, antes de 2100, os holandeses nativos serão minoritários nos Países Baixos.
A Áustria conheceu várias vagas de imigração na pós-Segunda Guerra Mundial. Inicialmente, chegaram sobretudo europeus que fugiam do regime comunista: 180 mil húngaros em 1956; 162 mil checos em 1968; e 33 mil polacos em 1981. Em 2019, cerca de 16,2% da população austríaca tinha nascido no estrangeiro (fonte), e 22,8% da população teria origens estrangeiras (fonte). Dos 16,2% de estrangeiros, 61% não são europeus, vindo essencialmente do Médio Oriente, Ásia e África (fonte). A população muçulmana era de 700 mil pessoas em 2019, tendo duplicado entre 2001 e 2016 (fonte), e segundo os demógrafos austríacos, os muçulmanos poderão representar até 30% da população austríaca em 2046 (fonte). Se as projecções estiverem corretas, os austríacos nativos serão minoritários antes de 2100.
A Dinamarca nunca foi um país de imigração até ao início dos anos 2000. Antes disso, era sobretudo um país de emigração. A partir dos anos 2000, a imigração na Dinamarca começou a aumentar. Em 2019, havia 612 mil pessoas nascidas no estrangeiro a residir no país nórdico (fonte), das quais 353 mil tinham nascido fora da Europa e cerca de 156 mil nasceram na Dinamarca mas com pais nascidos fora da Europa (fonte). Numa população total de 5,8 milhões, isso representa 8,8%. Quanto à população muçulmana, representava 5,4% em 2019, e estima-se que poderá atingir entre 8% a 16% em 2050, segundo as estatísticas do Pew Research Center — caso se mantenha a actual política firme de controlo das fronteiras (fonte).
A Suécia é um caso emblemático da problemática causada por uma imigração extra-europeia descontrolada, e tenta agora reagir (será demasiado tarde?) face à dimensão que a imigração tomou no país. Em 1950, a Suécia tinha cerca de 7 milhões de habitantes, dos quais 197 mil nascidos no estrangeiro, essencialmente europeus (fonte). Já em 2017, numa população de 10 milhões, a população nascida no estrangeiro atingia 1,8 milhões, quase 20% da população do país (fonte). No mesmo ano, se incluirmos as pessoas nascidas fora da Europa, bem como os seus filhos, cerca de 17,3% da população terá origens extra-europeias (fonte). Para se ter uma ideia, em 2015, 34,3% das crianças entre os 0 e os 17 anos tinham nascido fora da Europa ou tinham nascido na Suécia de pais (ou pelo menos um progenitor) nascidos fora da Europa. Desses, uma parte significativa é oriunda do Médio Oriente, África e também do Extremo Oriente (fonte). Segundo alguns demógrafos, a Suécia — que contava com menos de 1% de extra-europeus em 1980 — poderá ver a sua população nativa tornar-se minoritária em 2070 (fonte).
No Reino Unido, o debate sobre a imigração tem sido cada vez mais feroz, e não passa um mês sem que ingleses nativos saiam às ruas para protestar contra aquilo a que chamam uma “política de portas abertas”. País de emigração durante séculos, começou a receber imigrantes do resto da Europa a partir da segunda metade do século XIX e, a partir dos anos 1950, imigrantes provenientes dos países do CommonWealth. Entre 1997 e 2010, o Reino Unido recebeu 2,2 milhões de imigrantes, sendo que mais de metade vinham de países do CommonWealth, como a Índia e o Paquistão (fonte). Desde 1996, a imigração extra-europeia tem vindo a aumentar: cerca de 129 mil em 1998, subindo para 232 mil em 2018, essencialmente oriundos de África, subcontinente indiano e Médio Oriente.
Num país com cerca de 66 milhões de habitantes, 9,4 milhões nasceram no estrangeiro. Destes, 3,7 milhões nasceram na Europa, e 5,7 milhões fora dela (fonte). Dos 5,7 milhões, a esmagadora maioria provém de países fora do espaço civilizacional ocidental. Existem estatísticas “raciais” no Reino Unido, o que nos permite perceber a importância que a imigração extra-europeia tem tido no país, e que também nos diz muito sobre o resto da Europa Ocidental. Hoje, os brancos representam 73,3% da população da ilha — quando eram 99% no final dos anos 40 — mas, no futuro, a situação irá mudar. Estas estatísticas foram publicadas num estudo que tem gerado muita discussão nas ilhas britânicas, realizado por dezenas de universitários e investigadores em demografia, que apontam para o ano de 2063 como o momento em que os brancos (é o termo utilizado no estudo) — que povoam as ilhas britânicas há milhares, senão dezenas de milhares de anos — se tornarão minoritários. Segundo o mesmo estudo, em 2100, os brancos serão apenas 33,7% da população (fonte).
E o mesmo acontece noutros países…Na Bélgica, em 2018, 16,7% da população tinha nascido no estrangeiro, e em 2016 metade dos pedidos de nacionalidade belga foram feitos por pessoas de origem turca e marroquina (fonte). Prevê-se que, muito antes de 2100, os belgas nativos tornar-se-ão minoritários face aos extra-europeus no seu próprio país, levando uma jornalista do jornal Jeune Afrique a afirmar — citando um taxista marroquino — que a “Bélgica acabará árabe” (fonte), referindo-se à mentalidade islamista da juventude belga de origem magrebina e árabe. Quanto à Alemanha, país que até aos anos 80 recebia sobretudo imigrantes europeus, a situação alterou-se profundamente. A crise dos refugiados de 2015 mudou de forma marcante a composição demográfica do país. Em 2018, dos 82 milhões de habitantes, 13 milhões nasceram no estrangeiro, dos quais 7,7 milhões eram originários de fora da UE, sobretudo do Médio Oriente, do Extremo Oriente Asiático e de África (fonte). O fenômeno vai crescendo, e està a acontecer em todos os paises europeus.
E não são apenas as entradas que aumentam o número de populações de origem extra-europeia, mas sim uma natalidade bem acima das populações europeias nativas. Assim, e segundo dados oficiais do Instituto de Demografia Francês, as mulheres de origem extra-europeia apresentam uma taxa de natalidade muito superior à das mulheres francesas de raiz (ou de origem europeia se preferirem): 3,3 para mulheres sub-saharianas, cerca de 2,4 para mulheres magrebinas, contra 1,8 para mulheres europeias residentes em França (fonte).
As estatísticas por países mostram-nos que, contrariamente ao que dizem uma parte tanto das elites intelectuais como da comunicação social, o fenómeno da imigração extra-europeia para a Europa é relativamente recente, e que este tem vindo a ganhar tal importância que se tornou um dos temas que mais preocupam os europeus nativos. Resta-nos então questionarmo-nos: se mesmo nos anos 70 os países europeus eram extremamente homogéneos, quer isso dizer que a Europa não foi um continente aberto às migrações de populações de todo o Mundo no passado?
A Europa foi, de facto, uma terra de migrações. O Homem de Neandertal chegou à Europa há pelo menos 400.000 anos, e o Homo sapiens, há pelo menos 45.000 a 50.000 anos. Desde a chegada dos primeiros sapiens, a Europa recebeu populações provenientes da Ásia, do Médio Oriente e do Norte de África. Mas, e nos últimos 10 mil anos? Aí, o cenário muda completamente.
As últimas grandes migrações provenientes de fora da Europa datam de cerca de 7000 a.C., com a chegada de populações oriundas do Crescente Fértil — que os militantes do Bloco de Esquerda tenham calma: não eram palestinianos, nem sequer árabes — trazendo consigo a agricultura. Na altura, e de acordo com os estudos mais recentes, havia três grandes grupos genéticos na Europa: os WHG (Western Hunter-Gatherers), povos nativos do continente, presentes na Europa há pelo menos 45 mil anos — caçadores-recolectores de pele morena e olhos claros (azuis e verdes); os agricultores provenientes da Anatólia, chegados por volta de 7000 a.C. — de pele clara, mas cabelos e olhos escuros —, responsáveis pela introdução da agricultura; e os Yamnaya, ou indo-europeus, um povo de cavaleiros nómadas vindos das estepes da Ucrânia, altos, de pele clara, cabelos e olhos claros.
Estes últimos começaram, a partir de 3500 a.C., a espalhar-se por toda a Europa e também por algumas regiões da Ásia (até à Índia — daí o nome que lhes atribuímos). Este povo hipotético levou consigo uma língua: o proto-indo-europeu (PIE), que, ao longo dos séculos, se foi fragmentando em diversos ramos: proto-germânico, proto-celta, proto-albanês, proto-latim, proto-heleno, proto-eslavo, entre outros. Hoje em dia, quase todas as línguas faladas na Europa descendem dessa língua comum. Para além da língua, os indo-europeus difundiram os seus costumes, a sua visão do mundo, os seus deuses, as suas leis, o seu modo de vida guerreiro e as suas classes militares — aquilo a que Georges Dumézil chamou “sociedade tripartida”: oratores (os que rezam), bellatores (os que combatem), laboratores (os que produzem). Milénios mais tarde, esta estrutura social permaneceria visível nas três ordens da sociedade medieval.
Mais tarde, as colónias gregas e as conquistas romanas espalharam populações helénicas e latinas pelos quatro cantos da Europa e, com elas, a razão grega, o direito romano, a arquitectura greco-romana, entre outros elementos. As grandes invasões germânicas dos séculos IV, V e VI tiveram um efeito semelhante: povos de origem germânica disseminaram-se por todo o continente e trouxeram consigo o conceito de FreiMann, o homem livre portador de armas, que estaria na génese dos cavaleiros medievais — figuras que tanto povoaram os nossos sonhos de infância. Gregos, latinos, celtas e germanos eram todos povos europeus e, sem excepção, partilhavam origens indo-europeias. Um ponto essencial para o que se segue.
O magistral estudo Histoire des Populations Européennes, do demógrafo Jacques Dupâquier (elaborado em colaboração com mais de 35 demógrafos e historiadores), demonstra que a esmagadora maioria dos movimentos migratórios na Europa foi, essencialmente, de natureza intra-europeia. E os hunos, árabes, turcos e persas?
De facto, nos séculos IV e V ocorreram invasões militares protagonizadas por povos indo-iranianos (um ramo tardio dos indo-europeus), como os alamanos e os citas, bem como por povos asiáticos turco-mongóis, como os hunos. Mais tarde, seguiram-se as invasões militares árabes e turcas. Contudo, o que a investigação histórica, linguística e etnológica tem demonstrado é que, tanto do ponto de vista linguístico como religioso e cultural, a influência desses povos na Europa foi escassa. A explicação é simples: hunos, alamanos, citas e outros grupos não procuravam colonizar — vinham pilhar e partiam, levando consigo as populações civis que os acompanhavam. O mesmo padrão viria a repetir-se com os mongóis, séculos depois. Quanto aos árabes e turcos, não se verificou uma migração civil em larga escala para a Europa. O que ocorreu foi, sobretudo, um processo de islamização de populações europeias, através do estatuto de dhimmi, que levava cristãos e judeus à conversão para evitarem a opressão sob domínio muçulmano. O Islão foi, pouco a pouco, desaparecendo da maior parte da Europa com a Reconquista dos territórios anteriormente islamizados — com excepção da actual Bósnia, Albânia e Kosovo. No que respeita às populações magrebinas e árabes da Península Ibérica — muçulmanos ou convertidos, os chamados mouriscos — estas foram expulsas entre 1503 e 1609. Ou seja, os europeus acabaram sempre por resistir a tentativas de ocupação por povos não europeus. É uma constante da nossa longa História.
Se quisermos ir mais longe, podemos recorrer à obra Histoire de la population française (edições PUF, 4 volumes, 1988), também da autoria de Jacques Dupâquier, a qual demonstra que, ao longo de 5 000 anos, a população francesa — composta por caçadores-colectores e indo-europeus — variou muito pouco: apenas algumas percentagens ao longo dos séculos. Todas as transformações demográficas ocorridas durante esse período foram, esmagadoramente, de origem intra-europeia. Essa versão é corroborada por um estudo genético recente, que gerou amplo debate em França, ao revelar que os antepassados dos franceses nativos já habitavam o território actualmente francês há milhares de anos, tendo-se mantido inalterada durante pelo menos 5000 anos (fonte)! E pelo que dizem os paleogeneticistas, o mesmo é verdade para outras nações europeias, sempre com base em estudos genéticos.
Resumindo: as migrações indo-europeias/Yamnaya foram as últimas grandes movimentações populacionais a modificar de forma significativa a demografia europeia. A partir daí, elementos como o Cristianismo, o casamento monogâmico imposto pela Igreja Católica, a já referida razão grega (e a ciência grega), o direito romano e o ideal de reconstituir o Império Romano formaram um verdadeiro cimento civilizacional, que acabou por gerar uma forte homogeneidade cultural na Europa — ao contrário de outras regiões do mundo, onde povos vizinhos diferem profundamente em quase todos os aspectos. Os europeus — tanto os do continente como os dos Estados Unidos — partilham uma mesma civilização, sólida e estruturante, que moldou de forma profunda a mentalidade do europeu moderno. Trata-se de uma homogeneidade civilizacional que, pela primeira vez em muitos séculos (ou talvez milénios), está a ser posta em causa pela chegada em massa de populações oriundas de outras civilizações, cujas culturas, modos de vida, tradições, costumes e religião (uma em particular) poderão vir a transformar profundamente a face da nossa civilização. Uma verdadeira revolução antropológica e civilizacional — com consequências que poderão ser muito graves.
Existe, então, um tsunami migratório, como afirmam alguns, sobretudo nos sectores mais à direita do espectro político? Ao telefone, a resposta que André Posokhow me deu foi categórica: ainda não, mas virá, se nada for feito. De facto, segundo André Posokhow, se entram anualmente entre 2 a 3 milhões de imigrantes extra-europeus no espaço comunitário, ainda não se pode falar propriamente de uma invasão. Pelo contrário, o ex-eurodeputado Jean-Yves Le Gallou fala abertamente em “tsunami migratório” vindo do terceiro mundo. Que poderá vir a acontecer no futuro próximo? No livro The Scramble for Europe, Stephen Smith, jornalista americano, argumenta que, face ao subdesenvolvimento persistente em África, a Europa poderá vir a receber mais de 100 milhões de africanos até 2050, afirmando que a “Europa vai africanizar-se” (fonte).
Não será Stephen Smith um tanto alarmista? Provavelmente. Contudo, ano após ano, a imigração e a elevada taxa de natalidade das populações provenientes de África, do Médio Oriente e da Ásia fazem com que a percentagem de extra-europeus cresça exponencialmente a cada década e, com esse aumento, o aparecimento de pequenas nações cada vez mais antagónicas aos valores da Civilização Ocidental. Qual será a face da Europa em 2050, e em 2100? Sabendo que as segundas, terceiras e até quartas gerações tendem a assimilar-se ainda menos do que os pais e avós, e que muitas das gerações mais jovens de magrebinos, sub-saharianos e árabes apresentam sinais crescentes de radicalização religiosa, bem como um ódio crescente ao Ocidente — quando não um ódio especificamente anti-branco —, qual será o futuro dos europeus nativos? Quais serão as consequências, a médio e longo prazo, desta imigração que alterou uma estabilidade europeia milenar? Como conceber uma Europa próspera, democrática e tolerante num futuro em que os europeus nativos sejam minoritários no seu próprio continente? Como imaginar uma Europa composta por nações democráticas, quando a radicalização de parte das populações muçulmanas tem vindo a ser motivo de crescente preocupação — com alertas vindos dos serviços secretos e dos líderes militares por todo o continente? Enquanto, por toda a parte no Ocidente, os europeus nativos (e os euro-americanos) começam a manifestar sinais de insatisfação, as nossas elites não só permanecem inertes, como procuram silenciar qualquer sentimento de revolta.
Pior ainda, em alguns casos, agravam a situação, como sucedeu com os juízes da Cour Nationale du Droit d’Asile francesa, que autorizaram cerca de dois milhões de habitantes de Gaza a refugiarem-se em França. Segundo o director do Observatório da Imigração em França, Nicolas Pouvreau-Monti, as leis emanadas por certos juízes franceses poderão obrigar legalmente a França a acolher cerca de 580 milhões de refugiados — um número que ultrapassa em oito vezes a população actual do país (fonte). Que consequências adviriam se 580 milhões de pessoas decidissem efectivamente estabelecer-se em França? Certamente o colapso… E o que poderia então suceder ao restante da Europa?
As elites políticas do Ocidente falharam. Não souberam agir enquanto ainda havia tempo e agora mostram-se inquietas perante as reacções violentas que têm começado a surgir pela Europa fora. Os dirigentes europeus teriam feito melhor em escutar e ler Enoch Powell, que nos advertira, há sessenta anos, sobre o impacto futuro da imigração. Em vez disso, preferiram atacá-lo, estigmatizá-lo e arruinar-lhe a carreira. Mais grave ainda, negligenciaram o que ele considerava ser a essência do verdadeiro desígnio de um estadista:
Cumpre ao estadista, em sua mais elevada missão, resguardar a sociedade dos males que se antevêem. Nesta empresa, defronta-se com entraves profundamente entranhados na condição humana. Entre eles avulta, por certo, o facto de ser impossível provar a existência de um perigo antes que este se concretize. (In Rivers of Blood Speech, Enoch Powell, 1968).
observador