Criptomoedas – De criança-prodígio a adolescente problemático

A bitcoin faz este ano 16 anos. Nasceu envolta em promessas… A Europa, em 2023, parecia ainda continuar a acreditar no potencial das moedas virtuais. No regulamento relativo aos mercados de criptoativos, aprovado nesse ano, consta: “As ofertas de criptoativos poderão abrir caminho a uma forma inovadora e inclusiva de financiamento”, ou seja, uma nova fonte de financiamento para as empresas em alternativa às bolsas e aos bancos – os investidores financiariam empresas em troca de criptomoeda.
Também se avançava a possibilidade de as criptomoedas serem um concorrente da Visa nos pagamentos ou substituírem os bancos nas transferências bancárias, por terem preços mais competitivos, ao eliminarem intermediários. “Quando utilizados como meio de pagamento (…) podem proporcionar (…) pagamentos mais baratos, mais céleres e mais eficientes.”
A par das promessas, existiam riscos. O anonimato facilitaria o branqueamento de capitais, e o elevado custo energético das operações de transferências e da mineração, assim como a montagem da infraestrutura, teriam um custo ambiental acrescido.
Após 15 anos de vida, multiplicaram-se as moedas eletrónicas (existem hoje mais de 20 000 disponíveis), confirmaram-se os riscos, mas não se concretizaram as promessas. E, se na tecnologia o conhecimento dobra a cada 24 meses (Moore’s law), será realista continuar a acreditar?
Os efeitos negativos, já os conhecemos bem.
As criptomoedas são utilizadas por criminosos para branqueamento de capitais, existindo verdadeiras “empresas” que oferecem os seus serviços online. As moedas virtuais são utilizadas para “branquear” a origem de fundos de cibercrimes (como pagamento de resgates em ataques informáticos), mas também o tráfico de drogas e pessoas. Estima-se que, em 2023, mais de 20 mil milhões de euros foram branqueados utilizando criptomoedas (Chainanalysis 2024 Cryptocrime Report).
As criptomoedas são também utilizadas em esquemas de burla. Só em 2024, as vítimas terão perdido mais de dez mil milhões de euros. No ano passado, um banco (Heartland Tri-State Bank of Elkhart) nos EUA faliu quando o seu administrador canalizou os recursos do banco, os seus próprios e os da igreja (da qual era tesoureiro) para criptomoedas, ludibriado por um esquema e acreditando estar a fazer um investimento altamente rentável.
O custo ambiental é igualmente elevado. O consumo anual de energia em transações de bitcoins é igual ao consumo de energia da Polónia, um país de 36 milhões de habitantes e um dos cinco mais industrializados da União Europeia. A tal, acresce o uso da água (para manter os sistemas refrigerados). De acordo com os cálculos divulgados pela Universidade de Amesterdão em 2023, uma única transação de bitcoin utiliza seis milhões de vezes mais água do que uma transação de pagamento com cartão de crédito.
A China, sempre pragmática, baniu em 2017 os criptoativos, declarando que o custo de supervisão destas operações era demasiado elevado, face aos sucessivos escândalos de burlas e branqueamento de capitais. Não menos relevante, na decisão do Partido, terá sido o facto de as criptomoedas estarem a ser utilizadas para evitar os controlos de capitais. Em 2017, nenhum cidadão chinês podia deter ativos no estrangeiro, incluindo depósitos, em montante superior a 50 000 dólares. Nos dez anos anteriores, este ativo foi um meio relativamente simples de transferir fundos para o estrangeiro, pondo em risco, na perspetiva das autoridades chinesas, a estabilidade financeira do país.
A União Europeia divulgou, em janeiro passado, o primeiro relatório do impacto do Regulamento dos Criptoativos. No mesmo, reconhece os efeitos negativos das moedas virtuais e que os eventuais benefícios ainda estão por concretizar. As criptomoedas permanecem um ativo que nada acrescenta à economia, a não ser custos, e cujo valor é meramente especulativo, baseado em expectativas sem qualquer fundamento na realidade.
Mantendo-se a possibilidade de investir em criptoativos, cabe-nos pensar se é este o melhor destino das nossas poupanças e, sobretudo, manter uma postura vigilante – quando o investimento parece demasiado bom… provavelmente não é.
OUTROS ARTIGOS DESTE AUTOR
+ Ler ou não ler? Eis a questão
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.
Visao