Na América Latina, o cinema questiona ditaduras passadas e faz soar o alarme

Há tantas séries e filmes na América Latina sobre ditaduras do século XX que eles formam um gênero por si só. Do Chile ao Brasil, passando pela Argentina, os diretores exploram uma memória ainda crua, salpicada de crimes impunes e desaparecimentos forçados, relata o diário espanhol “El País”. O exemplo mais recente é o thriller político brasileiro “O Agente Secreto”, que foi apresentado no Festival de Cinema de Cannes.
Os heróis da nova série argentina O Eternauta [lançada na Netflix no final de abril de 2025] são moradores do bairro de Vicente López, em Buenos Aires. Cidadãos comuns de classe média que não estavam preparados para enfrentar a neve tóxica enviada por invasores alienígenas. Eles devem, portanto, aprender a se organizar, construir trincheiras e pensar juntos para formar uma frente comum.
Esta história é uma adaptação da série de histórias em quadrinhos homônima , criada em 1957 por Héctor Germán Oesterheld. Dois anos antes, em Buenos Aires, ele havia sobrevivido ao bombardeio da Praça de Maio por aviões militares [durante uma tentativa de golpe de Estado por soldados opositores ao presidente Juan Perón, que logo seria deposto] e, depois, à execução de peronistas em um lixão [em 1956, sob a presidência do general Pedro Eugenio Aramburu, na cidade de José León Suárez]. Héctor Germán Oesterheld e suas quatro filhas acabariam por estar entre os milhares de pessoas desaparecidas durante a ditadura militar [1976-1983] .
A relevância histórica desta história em quadrinhos [traduzida para o francês pela Vertige Graphic] a tornou um símbolo, agora reimpressa na Netflix quase setenta anos depois. E este não é um caso isolado: filmes e séries sobre as ditaduras da segunda metade do século XX na América do Sul estão se multiplicando, principalmente porque fazem grande sucesso. Seus diretores falam deles como avisos de eventos atuais urgentes.
Mais um vencedor do Oscar de Melhor Longa-Metragem Internacional, Eu Ainda Estou Aqui [dirigido por Walter Salles e lançado em 2024] conta a história da luta de uma carioca para sustentar a si mesma e aos quatro filhos depois que seu marido, um opositor político, foi sequestrado e assassinado em 1971, durante a ditadura [que durou no Brasil de 1964 a 1985]. Dos quatro filmes sul-americanos vencedores deste Oscar, três retratam a vida sob um regime militar.
Na última edição da Berlinale [Festival Internacional de Cinema de Berlim], o Prêmio Fipresci também foi concedido a Bajo las banderas, el sol [“Sob as bandeiras, o sol”, inédito na França]. Este documentário paraguaio apresenta imagens de arquivo de Alfredo Stroessner, o chefe de Estado de fato do país por trinta e cinco anos (1954-1989) e considerado o primeiro ditador da região naquela época.
Da mesma forma, o único filme sul-americano na seleção oficial do Festival de Cannes de 2025 é o thriller político brasileiro O Agente Secreto [dirigido por Kleber Mendonça Filho], que conta a história de um professor que foge de São Paulo em 1977 [também em meio a uma ditadura], após ser acusado de supostamente se envolver em atividades subversivas.
“Se não promovermos a memória histórica, o que nos aconteceu voltará a acontecer: é por isso que, todos os 24 de março [por ocasião do Dia Nacional da Memória],
Courrier International