A estratégia de rastreamento e isolamento da COVID-19 na Colômbia falhou? Uma análise revela por que o sistema PRASS não funcionou como esperado.

Durante os meses mais difíceis do lockdown da COVID-19, a Colômbia optou por uma medida que permitiria a reabertura da economia sem comprometer a saúde pública: o programa PRASS, sigla em inglês para Teste, Rastreamento e Isolamento Seletivo Sustentável. No papel, era uma solução lógica. Na prática, acabou refletindo as falhas estruturais do sistema de saúde e a desigualdade territorial, de acordo com um estudo de caso que analisou qualitativamente os resultados do programa.

Desorganização, falta de apoio social e falhas técnicas dificultaram o plano de rastreamento da COVID-19. Foto: Arquivo El Tiempo
O chamado PRASS (Sistema Prático de Seguridade Social) foi criado em meados de 2020 com um objetivo ambicioso: romper as cadeias de transmissão do vírus sem confinar toda a população. Para isso, os casos precisavam ser identificados, os contatos rastreados e os indivíduos infectados isolados em tempo hábil. Os principais componentes incluíam compensação financeira para aqueles que precisassem se isolar caso tivessem baixa renda e a participação de seguradoras de saúde (EPS), seguradoras de riscos ocupacionais, hospitais e autoridades locais.
O estudo foi liderado por pesquisadores do Centro de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Universidade dos Andes e do Departamento de Saúde Pública da Universidade Industrial de Santander. Faz parte da Aliança para a Geração de Evidências sobre a COVID-19, sua Resposta e Lições Aprendidas para o Pós-Pandemia e Epidemias Futuras (Ágora). Especificamente, o estudo examinou como essa estratégia realmente funcionou por meio de entrevistas com 30 partes interessadas principais — autoridades nacionais e regionais que participaram da implementação do programa. A análise revelou que o programa PRASS não decolou como esperado.
Em 2021, um estudo publicado por Julián Fernández-Niño, diretor de epidemiologia do Ministério da Saúde durante a pandemia, e sua equipe estabeleceu que o PRASS poderia ter reduzido a letalidade em cerca de 48% se conseguisse contatar, identificar, isolar e diagnosticar cinco pessoas para cada caso positivo. Mas a realidade é que apenas 39,3% dos casos tiveram pelo menos um contato, e menos de 25% atingiram a meta de cinco ou mais contatos. Ou, em outras palavras, a lacuna entre a teoria e a realidade era enorme.
“A implementação do programa PRASS revelou complexidades sociais na implementação do isolamento seletivo. Nosso estudo destacou as principais barreiras à implementação do programa, mas também devemos destacar facilitadores como a coordenação entre diferentes setores da saúde: nacional-territorial, público-privado e privado-privado. Esses mecanismos de coordenação devem existir em tempos normais para que, em emergências, a resposta seja mais eficaz”, explicou Sandra Martínez, pesquisadora principal do estudo.

Falhas no Sistema de Prevenção e Controle da COVID-19 (Segcovid), falta de confiança e desigualdades sociais frustraram a estratégia de enfrentamento do vírus. Foto: Ministério da Saúde
Entrevistas com atores que participaram do programa revelaram diversas razões para seu baixo desempenho. Uma delas, segundo suas respostas, foi que o isolamento sustentável não era uma opção realista para aqueles sem renda diária garantida e foi concebido sem considerar plenamente as condições sociais, econômicas e territoriais do país. "O programa colidiu com realidades históricas que limitaram sua implementação", concluíram após analisar as respostas das entrevistas. Por exemplo, muitas pessoas não conseguiam se isolar porque viviam na economia informal — o chamado "rebusque" (catador) — ou porque compartilhavam pequenos espaços com várias pessoas.
“Falar de isolamento sustentável, quando as pessoas têm que sair e se virar sozinhas no dia a dia, quando vivem em espaços muito pequenos, onde não conseguem se isolar […] Isso foi… eu diria… um purismo epidemiológico impraticável e muito desconhecido. Acho que parte do problema foi que houve uma resposta bem focada das áreas de vigilância epidemiológica, epidemiologia e saúde pública, mas com muito pouca articulação com toda a área de redes de apoio social e todo o desenvolvimento social […] E isso foi insuficiente, e percebemos a desigualdade que existe, a falta de solidariedade, um tecido social frágil, que é o que realmente vemos no nosso país”, respondeu o líder de uma EPS que participou do estudo.
Por outro lado, o PRASS (Serviço Nacional de Saúde) exigiu a coordenação de atores que, na prática, não trabalhavam juntos. Alguns territórios conseguiram coordenar esforços graças à liderança de seus governadores, mas em outros, "o departamento principal se encarregou de tudo, e isso era algo que cabia ao EPS", disse um líder departamental do PRASS entrevistado. O sistema de saúde fragmentado, sem mecanismos de coordenação eficientes, complicou ainda mais a situação.
Outra descoberta importante feita pelos pesquisadores durante as entrevistas foi que as equipes do programa também enfrentaram múltiplas barreiras. Em muitos casos, os profissionais de saúde pública eram contratados com base em serviços, sem continuidade, com pagamentos atrasados e com pessoal insuficiente para responder à crise.

Sem renda ou apoio, milhares não conseguiram se isolar, apesar do plano oficial de isolamento social. Foto: @Alcaldiapereira
Somado a isso, havia um problema técnico crucial: o sistema de informações Segcovid, criado para rastrear casos e contatos, sofria falhas frequentes, resultando em perda de dados, manutenção manual de registros e sobrecarga da equipe. "Quando o sistema falhou, o PRASS falhou", admitiram vários entrevistados. Além disso, essas falhas afetaram a entrega de indenização financeira aos mais necessitados, um dos pilares do programa.
Por fim, os entrevistados destacaram dois obstáculos adicionais. Primeiro, o rastreamento de contatos, não apenas devido ao volume de pessoas que precisavam ser acompanhadas, mas também porque as pessoas frequentemente não atendiam o telefone, não queriam fornecer informações ou simplesmente não confiavam no sistema. Segundo, as diferenças territoriais. Em áreas rurais, dispersas ou com poucos recursos, a implementação foi muito mais difícil, e alguns municípios tinham apenas uma ou duas pessoas na vigilância epidemiológica e não conseguiram estabelecer a estrutura operacional necessária.
Que lições tudo isso deixa? Os pesquisadores enfatizam que, no futuro, elaborar estratégias no papel não basta. A implementação de um programa como o PRASS exige vigilância epidemiológica robusta, coordenação real entre as partes interessadas, sistemas de informação funcionais e condições sociais que possibilitem o isolamento, conclui o relatório. As metas de rastreamento devem ser adaptadas ao contexto e não ser idênticas para uma cidade conectada como Bogotá e para um município rural fronteiriço.
“O PRASS foi uma estratégia necessária para conter a transmissão por meio de rastreamento, isolamento e monitoramento. Mas sua implementação se mostrou mais complexa do que o previsto, exigindo coordenação entre saúde, tecnologia, proteção social, governos locais e comunicação de risco, além de integração de dados e construção da confiança dos cidadãos. Suas lições sobre governança, interoperabilidade e legitimidade social serão fundamentais para futuras respostas à pandemia”, concluiu Zulma Cucunubá, diretora da Aliança Ágora.
Para a próxima vez que a Colômbia enfrentar uma epidemia — porque está claro, segundo os especialistas, que haverá uma próxima vez — os pesquisadores propõem o fortalecimento da saúde pública a partir de uma perspectiva estrutural: com governança sólida, equipes técnicas estáveis e melhor conectividade. Mas também pedem a consideração dos mais vulneráveis: sem redes de apoio, sem confiança no Estado e sem garantias mínimas, qualquer estratégia será novamente insuficiente.

Sem coordenação e condições sociais, o isolamento era inviável em grande parte do país. Foto: Arquivo/EL TIEMPO
A Aliança para a Geração de Evidências sobre a Covid-19, sua Resposta e Lições Aprendidas para o Pós-Pandemia e Futuras Epidemias (Ágora) é um projeto de pesquisa liderado por acadêmicos de diversas universidades e financiado pelo Minciencias. Busca reconhecer lições aprendidas que subsidiem a tomada de decisões em saúde pública e o planejamento de ações eficazes em futuras emergências sanitárias.
Os resultados da Agora Alliance, juntamente com evidências importantes sobre a resposta à pandemia e lições para epidemias pós-pandemia e futuras, serão apresentados em 25 de julho em um evento na Pontifícia Universidade Javeriana, que também será transmitido on-line.
Jornalista de Meio Ambiente e Saúde
eltiempo