'Sem o oceano, não há humanidade': criadores de Ocean com David Attenborough

Em seu último documentário, 'Ocean with David Attenborough', o lendário naturalista britânico — agora com 99 anos — convida os espectadores a mergulhar no universo mais vital, surpreendente e desconhecido do planeta: o oceano. Com imagens nunca antes vistas, uma narrativa poderosa em primeira pessoa e uma urgência que permeia cada quadro, o documentário transmite uma mensagem clara: um oceano saudável é a chave para um planeta estável, cheio de vida e um futuro.
Ao longo de 84 minutos, Attenborough compartilha como sua vida coincidiu com a grande era das descobertas marinhas, viajando por recifes de corais, florestas de algas e oceano aberto. O filme não é apenas uma poderosa obra cinematográfica, mas também um apelo científico e emocional para proteger 30% dos oceanos do planeta até 2030. Seu tom é claro: ainda há esperança, mas não há tempo a perder.
A produção, liderada pelo diretor Toby Nowlan e pelo explorador da National Geographic Enric Sala, combina rigor científico, tecnologia avançada e uma narrativa profundamente humana. Filmado em condições extremas, Ocean com David Attenborough consegue mostrar — pela primeira vez — a devastação da pesca de arrasto industrial em alto mar e, ao mesmo tempo, a capacidade da vida marinha de se regenerar se tiver a oportunidade.
O documentário estreará em 8 de junho, Dia Mundial dos Oceanos, na plataforma Disney+. Em entrevista ao EL TIEMPO, Nowlan e Sala explicam como esse projeto foi possível e por que proteger o oceano não é apenas uma opção, mas uma necessidade existencial.

Toby Nowlan e David Attenborough. Foto: Conor McDonnell
Toby Nowlan: Trabalhando com o senhor. David é uma experiência incomparável. Ninguém mais mostrou tanto do mundo natural à humanidade. Ela vem fazendo isso há quase 100 anos e, durante todo esse tempo, manteve uma marca de confiança absoluta. Quando David diz algo, é verdade. Trabalho com ele há 16 anos, mas nada se compara a este documentário. Ocean com David Attenborough é sua mensagem mais pessoal, sua maior história. E dirigi-lo foi o maior privilégio da minha vida. Apesar de ser o maior contador de histórias, ele é incrivelmente humilde. Ele nunca quer falar sobre si mesmo, é um ótimo ouvinte, sempre interessado em suas experiências. Trabalhar com ele é um sonho realizado e sempre surpreendente.

O documentário expõe as realidades e os desafios que nosso oceano enfrenta como nunca antes. Foto: Alex Warham
Enric Sala: Há muito tempo sabemos que o oceano é uma parte essencial do nosso sistema de suporte à vida. Também sabemos que abusamos dela com pesca excessiva, poluição e aquecimento global. A diferença com este documentário é que agora podemos mostrá-lo. As pessoas veem isso. E não é a mesma coisa para mim dizer que as reservas marinhas são importantes do que para Attenborough dizer isso. Sua voz é sinônimo de verdade. Tudo o que é dito no filme foi cientificamente validado. O documentário não é apenas comovente, é também rigoroso.
Uma das cenas mais chocantes é a pesca de arrasto industrial. Como eles conseguiram registrar algo que nunca tinha sido visto antes? Toby Nowlan: Esse era um dos grandes objetivos do filme. A pesca de arrasto é tão comum quanto arar a terra, mas tão destrutiva quanto devastar a Amazônia. E, no entanto, nunca tinha sido visto. Ficou escondido durante séculos. Foi tecnicamente difícil: filmar em profundidade, com pouca luz e com equipamentos em constante movimento. Muitas câmeras foram destruídas no processo pela violência do arrasto. Quando vi as primeiras imagens, fiquei em choque. Eu sabia que era devastador, mas ver aquilo foi outra coisa. A mente humana precisa ver para entender. E esse é o poder do cinema. Esse clipe de 90 segundos do Instagram já foi visto por dezenas de milhões de pessoas.

A cinematografia impressionante e envolvente mostra as maravilhas da vida no fundo do mar. Foto: Doug Anderson
Enric Sala: Escolher os locais foi fácil e difícil ao mesmo tempo. É difícil porque existem muitas reservas marinhas no mundo, mas queríamos mostrar que elas funcionam: elas trazem a vida marinha de volta. E não apenas dentro de seus limites, mas também fora. Isso desmascara o mito de que proteger mais oceanos prejudica a pesca. Estudos científicos mostram que, ao proteger uma área, as espécies se reproduzem e migram para áreas próximas. Mostramos isso com espécies locais, como lagostas, e espécies migratórias, como o atum-amarelo. Mesmo em áreas onde o aquecimento está matando os corais, se a reserva for bem administrada e os peixes forem abundantes, os corais podem se recuperar. Já tínhamos evidências científicas antes das filmagens. Só precisávamos mostrar isso.
No documentário, Attenborough diz que está chegando ao fim da vida. Como foi para você ouvir isso? Toby Nowlan: Foi incrivelmente emocionante. Como muitos, cresci assistindo. Ele me inspirou a me dedicar a documentários sobre a natureza. Ouvi-lo dizer isso agora entende que o lugar mais importante do planeta não é na terra, mas no mar, foi muito poderoso. Aquela cena na praia deixou uma profunda impressão em mim. Toda vez que vejo isso, me emociono. Este documentário é um presente. Já estamos usando isso para convencer governos a proteger mais áreas e proibir a pesca de arrasto. E acho que isso terá uma influência enorme. Já vi isso muitas vezes e sempre toca meu coração.
Por que é urgente proteger o oceano? Enric Sala: Porque sem o oceano não há humanidade. Ela nos dá alimento, regula o clima e produz metade do oxigênio que respiramos. Sem um oceano saudável, a Terra seria como Vênus.
Toby Nowlan: Proteger o oceano é proteger toda a vida na Terra. Se fizermos isso direito, poderemos ter um oceano mais repleto de vida do que qualquer ser humano pode se lembrar. Este não é um documentário antipesca. É um documentário pró-abundância, pró-oceanos saudáveis e pró-planeta vivo. E é essa a direção que devemos tomar.
Jornalista de Meio Ambiente e Saúde
eltiempo